Um poema preferido...





Canção para Luanda

Luandino Vieira



Um dos meus poemas preferidos chama-se: “Canção para Luanda” do autor Luandino Vieira. Este poema encantou-me porque me senti atraído pela maneira como este escritor descreve o povo angolano e a sua atividade diária, a forma como ele pergunta ao povo angolano pela sua cidade de Luanda. O povo diz que não pode responder porque tinha que trabalhar e que o tempo era muito curto, mas no fim, o povo percebe que Luanda é a sua terra, a sua cidade, o local onde vive e onde trabalha. Ninguém pode retirar "a esperança nos olhos/a certeza nas mãos"



Agecilau Godinho
Curso de Gestão do Ambiente







CANÇÃO PARA LUANDA



A pergunta no ar

no mar

na boca de todos nós:

– Luanda onde está?

Silêncio nas ruas

Silêncio nas bocas

Silêncio nos olhos



– Xê

mana Rosa peixeira



– Mano

Não pode responder

tem de vender

correr a cidade

se quer comer!



“Ola almoço, ola amoçoéé

matona calapau

ji ferrera ji ferrerééé”

– E você

mana Maria quitandeira

vendendo maboque

os seios-maboque

gritando

saltando

os pés percorrendo

caminhos vermelhos

de todos os dias?

“maboque m’boquinha boa

dóce dócinha”



– Mano

não pode responder

o tempo é pequeno

para vender!



Zefa mulata

o corpo vendido

batom nos lábios

os brincos de lata

sorri

abrindo seu corpo



– seu corpo-cubata!

Seu corpo vendido

viajado

de noite e de dia.

– Luanda onde está?



Mana Zefa mulata

o corpo cubata

os brincos de lata

vai-se deitar

com quem lhe pagar

– precisa comer!



– Mano dos jornais

Luanda onde está?

As casas antigas

o barro vermelho

as nossas cantigas

trator derrubou?



Meninos nas ruas

caçambulas

quigosas

brincadeiras minhas e tuas

asfalto matou?

– Manos

Rosa peixeira



quitandeira Maria

você também

Zefa mulata

dos brincos de lata

– Luanda onde está?



Sorrindo

as quindas no chão

laranjas e peixe

maboque docinho

a esperança nos olhos

a certeza nas mãos

mana Rosa peixeira



quitandeira Maria

Zefa mulata

– os panos pintados

garridos

caídos

mostraram o coração.

– Luanda está aqui!



(1957)

Comentários

  1. Luandino Vieira é genial ao transformar a gritante realidade em poesia.

    Mariana Maldonado

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